Durante uns tempos, para ir para a universidade eu tinha de apanhar a camioneta até à Póvoa e depois uma boleia até ao Porto. Ao fim do dia, se não chegasse à Póvoa a tempo da última camioneta, tinha de telefonar à minha mãe para me ir buscar e isso era uma daquelas coisas a evitar a todo o custo, porque eram muito raras as vezes em que ela encarava essa tarefa com boa disposição.
Ora, o que acontecia frequentemente era eu não ter dinheiro para o bilhete, por causa do tabaco que não deveria ter comprado, e por isso ia o caminho todo até à paragem da camioneta a olhar para o chão na esperança de encontrar os cem escudos que deveria ter guardado - coisa que nunca aconteceu -, e depois sentava-me no banco de pedra, em frente à paragem, na esperança que alguém da minha aldeia passasse e me desse boleia, o que felizmente aconteceu várias vezes.
Agora, quando olho para trás, tenho muitas vezes pena dessa rapariga que fui e sinto verdadeira compaixão ao vê-la naquele banco de pedra a dizer a si própria que não pode viver assim, que tem de ser mais sensata, e a saber que no dia seguinte vai fazer a mesma coisa. No dia seguinte, talvez não, mas na semana seguinte seguramente. Vai comprar o maço de tabaco, porque tem vergonha de estar sempre a cravar e vai acreditar que o acaso, ou a sorte, lhe vão deixar uma moeda de cem escudos no chão, mesmo que isso nunca tenha acontecido.
E o mais estranho é que eu continuo a ser essa rapariga. A moeda de cem escudos que estou à espera de encontrar é um emprego que me permita conciliar a vida familiar com a vida profissional. Porque não consigo ser só mãe e não quero abdicar de o ser por causa do trabalho. Desde que nasceu a minha primeira filha tornou-se óbvio, para mim, que seria impossível conciliar as duas coisas e, portanto, optei por desistir de uma delas, mas sempre à espera de encontrar a tal moeda algures no percurso escolhido.
E as moedas, como se sabe, têm dois lados, por isso eu teria de escolher entre:
Cara: um part-time numa empresa com pessoas motivadas e felizes.
Coroa: criar o meu próprio negócio.
Quem sabe um dia...afinal, já somos um movimento. De mães e pais.
Calita Fonseca
http://panadosearrozdetomate.blogspot.com/2011/05/so-preciso-de-uma-moeda-de-cem-escudos.html
Calita, a menina cresceu e teve a coragem de decidir. Estabelecer prioridades e actuar em conformidade, marca a diferença e para melhor! Esse dia em que as opções não se colocarão ao nivel da vida familiar e vida profissional, não deve estar longe. O Movimento revolucionar para flexibilizar não é um mero acaso.
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